A Mãe, a Filha e o Espírito da Santa
por @tally_mendonca
Em tempos em que precisamos relembrar a cada momento que o Estado é laico, é sempre importante refletir sobre a importância e os limites das religiões. E “A Mãe, a Filha e o Espírito da Santa”, do autor brasileiro PJ Pereira, é uma reflexão e tanto sobre o tema, com várias passagens que a gente lê jurando que não é ficção, tamanha a semelhança com os noticiários.
O livro conta a história de Pilar, menina que teria sido gerada pelos anjos e, por isso, é anunciada como a nova messias. Filha de uma mãe de santo de Terecô – religião afro-brasileira também conhecida como Encantaria ou Tambor da Mata – a menina já nasce com sua existência profundamente atrelada à religiosidade e passa a infância vendo duelos entre a mãe e a Igreja Católica da cidade, disputando fiéis. Na adolescência, depois de trocar o Nordeste por Brasília, Pilar tem contato com as igrejas evangélicas e descobre a potência que é a fé e o poder que é possível alcançar quando se domina a fé alheia. Após viajar pelo mundo, conhecendo inúmeras religiões, Pilar volta ao Brasil disposta a honrar seu título de nova messias e, para isso, cria uma espécie de seita que é praticamente uma colagem de retalhos de diversas religiões. A capacidade de manipulação de Pilar faz com que sua “invenção” ganhe cada vez mais adeptos, tornando sua líder extremamente poderosa e dando início a uma sequência de abusos e absurdos.
O livro foi inspirado em uma série de casos reais de abusos religiosos e, se a gente pensa só na sinopse, tem tudo para mostrar Pilar como uma pessoa assustadora. E ela é assustadora, sim. Mas é, também, encantadora. A Pilar que manipula e comete abusos é a mesma Pilar que foi abusada e sofreu por manipulações. Admirável e detestável, ao mesmo tempo. Pilar é uma protagonista incrivelmente humana e isso torna a leitura ainda mais cativante.